segunda-feira, 6 de maio de 2013

O clubinho de Max e a minha maioridade

Meus amigos de infância eram muito diferentes de mim. Eles jogavam bola muito bem, sabiam todas as gírias, andavam descalço na rua cheia de pedrinhas pontiagudas. Eu os acompanhava, porque não tinha o que fazer, e não gostava de brincar sozinho.
Max, o mais velho e líder da turma, tinha a liderança de nascença. Um negro grande, maior que todos. Tinha mãos incríveis. Tão incríveis que construiu meu carrinho de rolimã praticamente sozinho - eu só entregava as ferramentas - e não foi só isso: Ele escalava árvores e fundava clubinhos fixando pedaços de tábuas nos galhos. Ele sempre subia até a copa das goiabeiras pra pegar as melhores goiabas, enquanto eu ficava na metade, no galho mais confortável e seguro. Ás vezes, até sobravam goiabas pra mim.
Seus pés também eram incríveis. Ele quase não tinha chinelo. Andava descalço sempre. Eu não conseguia entender como ele não se incomodava em pisar naquele chão rústico de pedrinhas. Elas entravam e espetavam a sola do meu pé. Se eu pudesse arrumava botas pra andar naquele mato. Vira e mexe, eu o via tirando espinhos do dedão como se estivesse cortando a unha. Esses pés ajudavam muito na aderência ao solo do campinho, que o fazia correr muito e fazer todos os gols.
Eu estudava a tarde, mas acordava cedo pra brincar na rua. Um dia fui conhecer as instalações do novo clubinho. Era do lado da casa do Max. Um barraquinho feito de compensado que cabia todos os meninos, mas ficava no chão. A copa das árvores eram perigosas pra muita gente.
Quando entrei, fiquei boquiaberto. Era muito grande, cabia uns dez moleques lá dentro. Tinha uma mesa coletiva onde poderíamos desenhar ou pintar algo. A porta tinha tranca, e do lado dela havia uma portinhola que servia pra vigiar a entrada.
Não demorou pras paredes ficarem cobertas de fotos de mulheres peladas. Eu tinha uns 11 anos. Não sabia da existência da libido, tesão ou qualquer coisa assim, mas gostava de ver aquelas fotos. O irmão mais velho de Max tinha uma revista pornô muito melhor que Playboy. Era extrema e mostrava penetração, mas tinha umas páginas de mulheres com pinto que eu não entendia. O nome da revista era Brazil Magazine, e toda vez que eu ia para o clubinho, era essa a que eu folheava.
Em uma manhã que eu apareci por lá, antes de ir pra escola, notei uma aglomeração do lado de fora do clubinho. Perguntei o que estava se passando e me explicaram a brincadeira: cada um tinha 5 minutos dentro da instituição, na companhia das garotas da parede. Podia fazer o que quisesse, mas não podia passar de 5 minutos. Entrei pra fila.
Todos saíam com um sorrisão. Os mais velhos, cansados. Os mais novos, eufóricos. Entrei no clube. Tranquei a porta e fechei a portinhola. Na mesa havia uns recortes de fotos de nudez aleatórias e uma gosma em volta que parecia cola. Talvez não fosse.
Fiquei parado na frente das garotas da parede. Ouvia a animação do lado de fora e não sabia o que fazer. Além de tudo, eu não podia me atrasar pra escola. Eu estudava no centro, tinha que pegar o ônibus do meio dia.
Meu tempo estava se esgotando. Abaixei a calça do uniforme. Não podia sujá-la no chão de terra. Notei uma diferença no meu corpo. A mangueirinha que eu usava pra mijar estava diferente, e eu não sentia vontade de mijar. Era mais ou menos como eu me sentia quando eu folheava aquela revista do irmão mais velho do Max. Era mais ou menos como quando eu folheava as revistas que meu pai me deu quando disse que eu já estava crescendo.
Será que isso era ser adulto? Poder dominar sua mangueirinha e extrair dela o que você quiser? Comecei a me mexer repetidamente em movimentos retilíneos uniformes. Era bom. Não podia puxar muito a pele que doía.
Bateram na porta. Meu tempo acabou. Descobri que aquilo na mesa não era cola. Descobri uma porrada de coisa sobre mim mesmo.

Passei uns dias sem aparecer no clubinho. Preferi ficar em casa jogando videogame e vendo aquelas revistas de vez em quando. Cheguei a voltar uma vez e os meninos estavam no quintal. O clubinho havia sido demolido porque a mãe do Max estava com medo de bandidos se esconderem lá.
Os meninos não jogavam bola. Estavam pichando o muro com uns sprays de tinta que encontraram. Entrei na brincadeira mas não achei tão legal. Lembro que escrevi LUCAS na parede. Perguntei pro Max se estava certo, se pichar era daquele jeito mesmo. Ele respondeu:
- Não tem certo ou errado. O legal é você ter seu estilo. Faz do jeito que você achar melhor.
Larguei o spray e fui pra escola. Não me lembro de brincar na rua depois disso.

Um comentário:

  1. esse último parágrafo me lembrou de "This is England"..sei lá
    e o jeito que vc escreve é sempre muito bom..

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