Quarta feira, 1:18 da manhã. Batatas fritas, esfirras e kibes do
habibs esquentados no microondas, a quarta lata de Itaipava. Na TV um desenho
qualquer imita um reality show para crianças. Estou descobrindo o primeiro EP
do sonic youth. Queria ter como tirar uma foto que registrasse todo esse momento. Não tenho essa
capacidade.
O que há de mais belo na pós-modernidade também é o que há
de mais deprimente: a decadência da realidade. A vida real é ridícula de tão
real. A realidade arde, queima, ferve, machuca.
O Brasil meteu 7 no Haiti. Palermas comemoraram como “o
nosso 7x1”. “Demos o troco”, eles disseram. O Luciano Huck é o nosso brasileiro
mais carismático. Ele comentou o jogo. Falou que quando foi ao Haiti, perdeu a
esperança na humanidade. Eu queria ver a cara do Luciano Huck ao se deparar com
meia dúzia de escombros de uma cidade em ruínas. Bem diferente de qualquer
propaganda do Itaú.
Os haitianos enxergam os brasileiros como soldados
fortemente armados. Os brasileiros enxergam os haitianos como imigrantes
ilegais. Vendedores de relógios e fones de ouvido contrabandeados. O Brasil é a
potência imperialista da América Latina. Fizemos tudo errado.
Eu ainda ouço que sou existencialista demais pra conviver
com gente materialista. Como feministas radicais. Elas não tem tempo pra minhas
conjecturas porque estão ocupadas tentando mudar o mundo pela raiz. Eu ainda
acho que nada vai dar certo. Deus está morto?
Ofereço batata pro meu cachorro. Ele recusa, eu como. Vejo
artistas no facebook. São artistas ou só tem dinheiro pra fumar maconha demais?
A quarta lata acabou. Pego mais uma? As esfirras vão me dar azia, tenho
certeza.
Esqueci de dizer. Um grande símbolo da luta burguesa contra
a corrupção foi preso por contrabando. O japonês da federal. E pensar que a máscara
com a cara dele estampada foi uma das mais vendidas no carnaval deste ano. Não quero
pensar nisso. Rolo mais um pouco a timeline. Vejo a foto da Britney Spears sem
calcinha saindo de um carro. A bucetinha depilada dela parece só uma racha
qualquer. Uma dobra, como o meu sovaco.
Mas é excitante porque é a buceta da Britney Spears. Eu, um
reles mortal, um plebeu, não estou autorizado a ver a buceta da Britney Spears.
Mas eu olho mesmo assim. Um fotógrafo oportunista clicou o momento exato, jogou
a foto na internet e me deu o passe livre. Imediatamente me sinto tão privilegiado
que fico de pau duro. Não é a buceta que me excita, é a possibilidade. É poder.
O poder é o grande combustível da humanidade.
Numa relação sexual, a camisinha bloqueia qualquer conexão
sensorial via tato. Meu pau não sente nada. Eu sinto pelas mãos, pelo toque e,
principalmente, pela relação de poder. Se minha mulher se abre e se entrega
para mim, eu a preencho e domino, me sinto poderoso, pleno e capaz, e gozo. Meu
orgasmo não tem a ver com o sexo, com o atrito das terminações nervosas da
minha glande com as terminações nervosas das paredes vaginais de minha mulher,
mas com o quanto eu sou capaz de sentir prazer sendo opressor e do quanto ela
pode se permitir sentir-se submissa. “Sou sua vadia” eu ouvi certa vez. Foi excitante.
Imagino a Britney Spears me falando isso abrindo as pernas no banco de trás de
um carro e me pedindo pra fodê-la com força e no pêlo, e pronto, já estou com a mão na massa.
Sexo com amor é outra história. Confiança. Troca de
carinhos, induções. Toque sem pretensão. Vamos ver no que vai dar, e quando vê tá
lá, dentro, sentindo cada milímetro como uma corrente elétrica de baixa
voltagem. Pequenas cargas de orgasmo, suspiros. Não encoste em mim por alguns
segundos, mas pode me abraçar. Por que no fim eu sempre acabo caindo nesse assunto? Abro outra cerveja? Não, melhor caçar um doce de
sobremesa.